Porque somos contra a EaD na Enfermagem? Confira entrevista com presidente do Coren-MT

Formação precisa estar aliada às prerrogativas legais da profissão

09.10.2018

O Sistema Cofen/Conselhos Regionais é contrário ao uso indiscriminado da ferramenta de ensino à distância (EaD) na Enfermagem. Saiba mais sobre o assunto nesta entrevista com presidente do Coren-MT, Enf. Antônio César Ribeiro.

A principal crítica do sistema Cofen/Conselhos Regionais à prática da educação à distância em Enfermagem diz respeito à falta do contato do aluno com o paciente?

Antônio César Ribeiro: Não só quanto à falta de contato com o paciente, mas também quanto ao próprio conteúdo da aprendizagem. Microbiologia e a farmacologia, por exemplo, são disciplinas básicas da formação, que dependem de laboratório. Quando se faz a descrição de um órgão, é essencial que o aluno tenha contato com a peça anatômica real ou o manequim. O corpo é o objeto de estudo da Enfermagem. É muito difícil ensiná-las sem ter esse recurso, que a educação à distância não possibilita.

O que é a enfermagem? É cuidar, tanto na prevenção de doenças e na promoção da saúde como na cura e recuperação. Em ambos os casos, o objeto de trabalho é o corpo. Como aprender a cuidar sem tocar, sem interagir com o objeto de trabalho? Não é só manipular o corpo, mas saber se relacionar com ele, ouvir.

A formação de precisa estar aliada às prerrogativas legais da profissão?

Antônio César Ribeiro: Sim. O enfermeiro tem que fazer o diagnóstico de enfermagem e isso só é possível através da sistematização da enfermagem, que permite desenvolver o processo de enfermagem. Com referência a esta etapa inicial, que é a da investigação, na tentativa de definir diagnóstico, a conduta profissional e o serviço a ser prestado, como o professor vai ensinar um aluno a fazer semiologia, colher uma história, fazer exame físico à distância? Como ensinar a passar um sonda nasogástrica, por exemplo, sem o aparato necessário, que são os laboratórios de enfermagem?

Isso também dificulta a avaliação?

Antônio César Ribeiro: Sim. Como fica a possibilidade desse aluno devolver a técnica para o professor poder avaliar sua competência e destreza? Isso ele só consegue fazer quando o aluno tem acesso ao paciente e sob supervisão. O professor não pode orientar o aluno e ele ir sozinho para o campo manipular um corpo e experimentar o seu aprendizado. Nós temos divulgado a ideia de que nada substitui a presença, mas temos que ampliar esta reflexão no sentido da prática de ensino em si, que precisa estar vinculada à natureza do trabalho e do objeto deste trabalho.

O sistema Cofen/Conselhos Regionais e eu próprio, como educador, não confiamos na EaD como uma técnica adequada para o ensino da enfermagem, considerando aceitável apenas um percentual limite de 20% das disciplinas à distância. Há disciplinas que podem ser ministradas pela ferramenta EaD, mas a formação como um todo, é impossível.

Para as instituições de ensino, essa acaba sendo uma forma de baratear os custos?

Antônio César Ribeiro: Fazemos a crítica ao próprio Estado brasileiro que, por meio da reforma da LDB, nos anos 1990, institui isso e ampliou as formas de ensino, inclusive a EaD. Isso hoje, na verdade, atende a um interesse de mercado, ao barateamento do custo operacional. Nós temos escolas que reduziram o quadro de professores porque estão utilizando a ferramenta EaD.

Como o Conselho atua junto às instituições de ensino?

Antônio César Ribeiro: O Conselho, pela sua natureza, não pode interferir sobre as escolas de enfermagem, a fiscalização do ensino cabe ao Ministério da Educação. Não podemos fiscalizar os currículos, apenas exigir que quem esteja ensinando a prática seja enfermeiro credenciado ao conselho. Temos uma resolução sobre Responsabilidade Técnica que prevê que o coordenador do curso de enfermagem deve ter a Certidão de Responsabilidade Técnica, emitida pelo Conselho, mas não temos jurisdição sobre as escolas.

Mas, apesar disso, o sistema Cofen/Conselhos Regionais está muito atento e se articulando politicamente com o sistema educacional no sentido de convencer que o uso indiscriminado da ferramenta EaD é inviável não só para a Enfermagem, mas para qualquer formação na área da saúde.

Qual a sua recomendação e a do Coren-MT aos profissionais que buscam formação?

Antônio César Ribeiro: Que, ao buscar um curso, observe qual o percentual de disciplinas oferecidas pela ferramenta EaD. Se passar de 20%, eu, como educador, não recomendaria a formação nesta escola. Ainda que seja talvez mais barato o valor, não vai trazer benefícios em termos de inserção no mercado de trabalho e, mais grave ainda, uma vez inserido no mercado, o profissional e a sociedade se expõem a riscos de erros por imprudência ou imperícia.

 

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